Carta de Alfredo Pimenta para Oliveira Salazar
Nível de descrição
Documento simples
Código de referência
PT/AMAP/FAM/AALP/01-02-02/002-017/10-29-6-7-29
Tipo de título
Atribuído
Título
Carta de Alfredo Pimenta para Oliveira Salazar
Datas de produção
1941-12-04
a
1941-12-04
Dimensão e suporte
11 f. (30 x 21 cm); papel
Âmbito e conteúdo
A doutrinação monárquica e o assumir de estar doutrinalmente ao lado de Oliveira Salazar.
Assinaturas
Alfredo Pimenta
Condições de acesso
Comunicável
Condições de reprodução
A reprodução deverá ser solicitada por escrito através de requerimento dirigido ao responsável da instituição.
Cota atual
10-29-6-7-29
Notas de publicação
Referência bibliográficaPublicada in: SALAZAR E ALFREDO PIMENTA: Correspondência, 1931-1950 / Prof. Manuel Braga da Cruz .[Lisboa]: Verbo, 2008, pp. 159-161.
Transcrição
1941 rb 5-12 n.º 395 Lisboa 6ª feira Ex.mo Snr Presidente do Conselho: - o meu amigo major Alberto Margaride pediu-me que fizesse chegar às mãos de V.ª Ex.ª o trabalho e bem interessante que ele é! - que peço licença para juntar a esta carta. Ele tem empenho em que V.ª Ex.ª se digne passar os seus olhos por essas páginas, e receava que se lhas enviasse por outras mãos, se extraviassem.Cumpro o meu dever para com o meu amigo. Na última carta que tive a honra de receber de V.ª Ex.ª, dizia-me V.ª Ex.ª que considerava inconveniente «a doutrinação monárquica em forma de polémica». Ora acontece que as andam há semanas em polémica com o Caetano Beirão - Sem que este as provocasse. E chegam ao desaforo de se permitirem seringar-me (perdoe V.ª Ex.ª o plebeísmo da expressão) sem que eu, nesta conjuntura, tenha sido havido ou achado. Não é justo que aqueles senhores em cuja sinceridade ninguém pode fiar-se, tenham a liberdade de dizer tudo quanto lhes vem à cabeça - desde insinuações idiotas, até às deturpações mais escandalosas, e o Caetano Beirão ou eu sejamos ilaqueados pela Censura - por V.ª Ex.ª considerar inconveniente a doutrinação monárquica em forma de polémica. A minha posição já a defini. Entendo que é uma necessidade restabelecer-se o equilíbrio na vida política do País. Esta convicção tem raízes muito fundas. Pus e ponho ao serviço desta terra a minha vida. Deu-me a Providência a ventura de viver na hora em que V.ª Ex.ª é Governante desta pobre terra - com uma doutrina que é a minha, porque é. Até onde projecta V.ª Ex.ª no campo das realizações imediatas ou mediatas, essa doutrina, não o sei, nem preciso de o saber, para tomar as atitudes que tomo. Sei apenas, e isso me basta, que ou V.ª Ex.ª terá as possibilidades de ir até o fim, ou tudo soçobrará. Os sintomas repetem-se. Viu hoje o Diário de Notícias? Na 1ª página, no lugar do fundo, uma gravura, onde se exibem pessoas diante do Monumento aos Mortos da Grande Guerra. Repare V.ª Exª . Há lá quatro personagens que apresentam o mesmo gesto. Peça V.ª Ex.ª que lho decifrem.. Ou V.ª Ex.ª vai até o fim, ou tudo isto soçobrará. V.ª Ex.ª compreende: não tenho interesse pessoal na atitude que tomo. Não sei se já disse, mas se o disse, perdoe-me que o repita: o que me convinha: à minha idade (fiz ontem 59 anos!), à minha saúde e à tranquilidade da minha mulher e da minha filha - estas duas pobres almas que vivem à sombra dos meus fracos braços - o que me convinha era estar em silencio, absolutamente voltado para os meus trabalhos de estudante, fazendo vénias à direita, fazendo mesuras à esquerda, tirando o chapéu ao Santíssimo, não deixando de o tirar ao Grande Oriente Lusitano Unido, e proclamando em conversas discretas que é inoportuno e inconveniente discutir a Monarquia e a República. Leitor das "Novidades", seu colaborador literário, muito da Acção Católica, até talvez V.ª Ex.ª já me tivesse encontrado méritos para me dar um bom lugar rendoso e tépido - como a tantos e tantos tem feito. Era isto que me convinha. Mas aprendi, desde os 15 anos, a pôr as minhas conveniências pessoais em lugar secundário. Nasci para estudar, e dar conta dos meus estudos. O resto - o que Deus quiser! Assim me encontra V.ª Ex.ª nesta linha de combate, a primeira linha, a combater pela Nação: não no seu momento presente, mas no seu Futuro, e a combater por V.ª Ex.ª, porque se ponho o Rei na finalidade da minha acção, ponho V.ª Ex.ª no meu caminho, e a sua obra como base. É possível que V.ª Ex.ª hoje o não veja, e não abranja em toda a sua amplitude, o alcance da minha obra. Um dia a verá. É claro que nesta posição de sacrifício muito real e positivo, um prémio alcancei já, prémio que não salda as minhas dívidas e me não põe a coberto de dificuldades - mas enche de satisfação a minha consciência, e eu lego aos meus filhos e aos meus netos com indizível orgulho: a Consideração com que V.ª Ex.ª me trata, me lê e me escuta. Não deixo aos do meu sangue depósitos nos Bancos ou fartas leiras de pingues rendimentos, mas deixo-lhes, a par duns maços de cartas de dois Reis, estas 25 cartas de V.ª Ex.ª que guardo avarentamente na gaveta, e hão-de ser, Se Deus quiser, aumentadas, porque Deus lhe há-de conceder muitos anos de vida, e a mim há-de dar-me a graça de nunca desmerecer da sua consideração. Ora neste combate em que ando, e em que luto contra o peso morto de uns e a estupidez de outros, e os interesses alarmados de terceiros, e em que ponho toda a sinceridade e toda a seriedade, tenho o direito de esperar que não me tolham - não estou a bater-me pelos meus interesses pessoais, mas sim pelo Bem da minha Pária, visto, não através de lugares rendosos que ocupe, mas unicamente através da minha inteligência e dos meus conhecimentos de estudante. E se invoco o nome de V.ª Ex.ª algumas vezes, faço-o por dois motivos fundamentais: em primeiro lugar, porque é o meu dever - perante a Nação, e perante V.ª Ex.ª, enquanto V.ª Ex.ª me não disser que o seu Pensamento se filia nas Enciclopédias e na Revolução Francesa; e se o dissesse seria preciso fazer a prova absurda. Em segundo lugar, porque não quero dar aos adversários de V.ª Ex.ª ensejo ou pretexto, para que me julguem seu amigo, deles. Graças a Deus, nesta minha agitada acção, não há um aplauso, uma simpatia , uma cortesia a acolher as minhas palavras, vindas do campo adverso de V.ª Ex.ª. Isso não! A minha conferencia do Porto fez correr o boato de que eu estava preso, e fora demitido da Torre do Tombo: foi o delírio em certos meios - naqueles que se inspiram na "Seara Nova" na e nas "Novidades". As ofensivas do "Século" e das "Novidades" são bem acolhidas entre aqueles que sonham dia e noite, a queda de V.ª Ex.ª. As minhas palavras é que o não são... Deus me livre de que alguém me supusesse hostil a V.ª Ex.ª! V.ª Ex.ª faz-me a justiça de crer que, para fundamentar os meus juízos, não recorro a sofismas, ou a habilidades. Invoco V.ª Ex.ª - as suas palavras públicas, as suas atitudes públicas, para documentar a minha afirmação de que estou doutrinariamente ao seu lado, e para manter ao seu lado, os que me ouvem, os que me seguem, e os que confiam em mim. Eu queria que todos os pensam estivessem com V.ª Ex.ª. Infelizmente vou ainda a meio caminho. Já cá está o Caetano Beirão. Não custou muito porque é sincero, bem intencionado, e culto. Mas tinha um espinho.. Outros virão, espero-o em Deus. E outros já teriam vindo, se não tivessem medo de se enganar. Ah! Como eu quereria tranquilizar estes! Desabafei. Perdoe V.ª Ex.ª a extensão do desabafo. Mas vexado com a liberdade e a impunidade que se concede a medíocres e aventureiros, a hipócritas e videirinhos para se erguerem contra mim e me desafiarem a polémicas em que eu não estarei à vontade - eu quis ter este desabafo com V.ª Ex.ª, esperando da sua inteligência a compreensão que mereço. De V.ª Ex.ª m.to attº v.or e obrg.o A.P.
Relações com registos de autoridade