"1. A actividade profissional dos tabeliães de notas, originariamente regulada em termos muito rudimentares nos regimentos de D. Dinis, de 1305, aparece já tratada com algum desenvolvimento, entre matérias de índole diversa, nas várias compilações das Ordenações do Reino. Mas o primeiro regulamento notarial digno desse nome só surge entre nós quase ao despontar do século XX com a publicação do Decreto de 23 de Dezembro de 1899, no qual foram compendiadas não só as disposições relativas ao provimento dos lugares de notários públicos, às suas atribuições, direitos e responsabilidades, como as normas que definem os actos notariais e estabelecem os seus requisitos formais. O diploma revela já uma noção muito apurada da importância que, no plano jurídico e social, reveste a função do notariado, quando no respectivo relatório, ao criticar a exiguidade do exame de instrução primária, requerido pelo Decreto de 7 de Setembro de 1882 como habilitação suficiente, afirma: «... sendo os actos e extractos a que os notários têm por lei de prestar a sua intervenção tão importantes que, na maior parte das vezes, deles dependem a tranquilidade e os destinos das famílias, e requerendo muitas vezes a sua redacção o mais profundo conhecimento do direito, de modo nenhum se justifica que para o desempenho do melindroso e difícil serviço do notariado se exijam tão pequenas habilitações». E na preocupação de valorizar o exercício da profissão, em harmonia com a delicadeza dos interesses que lhe estão confiados, passou a exigir para o ingresso na carreira a posse de um curso jurídico, ao mesmo tempo que separou as escrivanias judiciais das funções do notariado, até ali cumulativamente exercidas pelos mesmos serventuários. A função notarial começa então a adquirir as características que a individualizam na actualidade e a importância que lhe foi reconhecida cedo evidenciou a necessidade de aperfeiçoar a respectiva disciplina legal. Assim, menos de um ano volvido sobre a publicação das providências inovadoras de 1899 viu-se o Governo forçado a promulgar um novo regulamento (Decreto de 14 de Setembro de 1900), que, tendo como principal objectivo promover a revisão do sistema de recrutamento dos notários e limar algumas das arestas mais vivas da reforma anterior, nenhuns progressos dignos de menção trouxe, porém, no que respeita aos aspectos formal e substancial dos actos notariais. Apesar de alterado por múltiplas disposições dispersas, entre as quais cumpre destacar as provenientes do Decreto n.º 4170, de 26 de Abril de 1918, e do Decreto n.º 5625, de 10 de Maio de 1919, o Regulamento de 1900 manteve-se como estatuto fundamental do notariado até à entrada em vigor do Decreto n.º 8373, de 14 de Setembro de 1922. A publicação deste diploma não teve em vista organizar os serviços em moldes distintos dos estabelecidos na legislação vigente. O principal intuito da reforma de 1922 consistiu apenas, como se diz no artigo 1.º da lei que a autorizou, «em codificar todas as disposições legais referentes à organização e funcionamento do notariado ...». Regulamentou, entretanto, com maior desenvolvimento a actividade dos notários e imprimiu às respectivas normas uma sistematização mais conveniente, sem deixar de aperfeiçoar, em acentuada medida, a disciplina legal da instituição. O Decreto n.º 15304, de 2 de Abril de 1928, que promulgou o primeiro Código do Notariado, foi, porém, o diploma que deu início à fase de mais nítido progresso legislativo na marcha evolutiva da organização notarial. Nele se encontra o primeiro estatuto completo dos notários; e, ao mesmo tempo que reforma a estrutura dos serviços, regula minuciosamente a prática dos actos notariais. A despeito do merecimento intrínseco dos seus preceitos, este código não logrou perdurar: depois de escassos quinze dias de aplicação, a vigência da reforma de 1928 foi indefinidamente suspensa pelo Decreto n.º 15651, de 28 de Junho do mesmo ano. Mas a verdade é que exerceu nítida influência sobre o articulado dos códigos que posteriormente vieram a ser publicados. Tanto o código aprovado pelo Decreto n.º 19133, de 19 de Dezembro de 1930, como aquele que veio a ser promulgado pelo Decreto n.º 20550, de 26 de Novembro de 1931, pouco se afastaram das linhas gerais da organização e da técnica fixadas no Código de 1928. A preocupação que o legislador manifestou de dotar o notariado com um estatuto estável, expressivamente documentado na sucessiva publicação destes três códigos, não ficou, entretanto, inteiramente satisfeita. Menos de quatro anos decorridos sobre a publicação do diploma de 1931, o novo Código de 24 de Novembro de 1935 introduz importantes inovações, quer na organização dos serviços, quer no exercício da própria actividade notarial.
2. O Código de 1935, de vigência mais prolongada do que qualquer dos diplomas precedentes, constitui ainda hoje o diploma base do serviço notarial; grande parte das suas disposições é, porém, desde há muito direito revogado. Com efeito, as matérias relativas à disciplina dos notários e do respectivo pessoal auxiliar passaram a ser quase inteiramente reguladas pelo Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, depois que o Decreto-Lei n.º 35390, de 22 de Dezembro de 1945 (mais tarde substituído pelo Decreto-Lei n.º 40739, de 24 de Agosto de 1956), criou a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado; por outro lado, tudo quanto diz respeito à organização territorial e classificação, das repartições, bem como ao provimento dos lugares, às regalias e obrigações dos respectivos funcionários, veio a ser integrado no Decreto-Lei n.º 37666, de 19 de Dezembro de 1949, posteriormente convertido na lei orgânica dos serviços (Lei n.º 2049, de 6 de Agosto de 1951). Em vigor subsistiu apenas a parte que se pode considerar específica do código, constituída pelas disposições respeitantes à competência funcional dos notários e ao formalismo da execução dos actos nela compreendidos, que, aliás, têm sido objecto de vários aditamentos, mais ou menos importantes, como os introduzidos pelos Decretos-Leis n.º 32033, de 22 de Maio de 1942 (sobre escrituras de habilitação), n.º 39240, de 12 de Junho de 1953, n.º 39450, de 24 de Novembro de 1953 (sobre legados pios), e n.º 40603, de 18 de Maio de 1956 (sobre o registo predial obrigatório e escrituras de justificação notarial)."
(...) In:https://dre.pt/application/dir/pdf1s/1960/04/09200/09330974.pdf